segunda-feira, 27 de junho de 2011

TRAUMA RAQUIMEDULAR


 


 CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS


 


               A coluna vertebral é formada por trinta e três (33) a trinta e quatro (34) vértebras (07 cervicais, 12 torácicas, 05 lombares, 05 sacrais e 04 ou 05 coccígeas).


               O forame ou conduto vertebral é formado pela parede posterior do corpo vertebral e parede anterior do arco vertebral, e a superposição dos vários forames vertebrais forma o canal raquídeo, que aloja e protege a medula espinhal.


               A medula espinhal, nos adultos, possui cerca de 45 cm e estende-se desde a altura do atlas (C1) até a primeira ou segunda vértebra lombar.


               A medula espinhal afila-se para formar o cone medular, do qual se estende um filamento delicado, denominado de “filum terminale”, que se insere próximo ao primeiro segmento coccígeo.


               Na parte baixa do canal vertebral, descendem as raízes dos nervos espinhais


caudais, que, juntamente com o “filum terminale”, formam a cauda eqüina, que tem o seu início no nível de T11 e termina, caudalmente, no nível do terceiro segmento sacral, ocupando sozinha o canal vertebral abaixo


de L2.


               A medula espinhal está dividida em segmentos e as raízes nervosas que emergem da medula no nível de cada segmento são designadas por algarismos que se referem ao nível de sua saída. Trinta e um pares de nervos espinhais originam-se da medula espinhal (08 cervicais, 12 torácicos, 05 lombares, 05 sacrais e 01 coccígeo).


               O primeiro par de nervo espinhal emerge entre o occipital e o atlas (C1), de modo que, na coluna cervical, o nervo emerge, cranialmente, junto a sua vértebra correspondente. Somente a partir do primeiro segmento torácico, o nervo espinhal emerge caudal à sua vértebra correspondente. Cada raiz nervosa recebe informações sensitivas de áreas da pele denominadas de dermátomos e, similarmente, cada raiz nervosa inerva um grupo de músculos denominados de miótomos.


               A localização do segmento da medula espinhal não está na mesma altura do segmento ósseo vertebral correspondente; como exemplo, observamos que o segmento medular C8 está localizado no nível entre C6-C7 e o segmento medular T12 no nível de T10.


               A medula espinhal é um grande condutor de impulsos nervosos sensitivos e motores entre o cérebro e as demais regiões do corpo. A medula espinhal possui tratos orientados longitudinalmente (substância branca) circundando áreas centrais (substância cinzenta) onde a maioria dos corpos celulares dos neurônios espinhais estão localizados.


               Ao corte transversal, a substância cinzenta apresenta a forma de H e pode ser subdividida em corno anterior, lateral e posterior.


               No corno anterior, estão localizados os corpos celulares dos neurônios motores e visceromotores (aferentes), no corno posterior os neurônios sensitivos (eferentes) e no corno lateral os neurônios do sistema simpático.


               As fibras motoras, oriundas do corno anterior, juntam-se às fibras sensitivas do corno posterior para formar o nervo espinhal.


               Os tratos da substância branca constituem vias nervosas ascendentes e descendentes, que conduzem impulsos nervosos em direção ao cérebro e de várias partes do cérebro para o resto do corpo. Os tratos mais importantes do ponto de vista clínico são os relatados a seguir.


 


 


AVALIAÇÃO CLÍNICA


            O atendimento do paciente no local do acidente é de grande importância para a sua avaliação inicial, reconhecimento de suas lesões e prevenção de lesões adicionais durante o seu resgate e transporte para o local onde deverá receber o atendimento definitivo.


            Devem ser sempre consideradas a presença de uma lesão da coluna vertebral e a manutenção da imobilização do paciente até que esse tipo de lesão possa ser avaliado com segurança por meio de radiografias e outros exames complementares, quando necessários.


            As lesões instáveis da coluna vertebral sem lesão neurológica, principalmente em pacientes politraumatizados, vítimas de colisões em alta velocidade, inconscientes


ou alcoolizados, possuem grande potencial de lesão adicional das estruturas nervosas durante o resgate e transporte dos pacientes, existindo inúmeros exemplos clínicos de pacientes com quadro neurológico normal após o acidente, e que sofreram lesão das estruturas nervosas durante o resgate e transporte. Em pacientes inconscientes e vítimas de colisão de automóveis ou quedas, a possibilidade da coluna cervical estar lesada é de 5 a 10% e observouse, no estudo de trezentos (300) pacientes portadores


de fratura da coluna cervical, que cerca de 1/3 das fraturas não foram diagnosticadas no momento do atendimento inicial.


A avaliação do paciente compreende a história, exame físico, exame neurológico e exame radiológico.


A história do trauma e informações acerca do estado geral do paciente previamente ao trauma são de grande utilidade para auxiliar no esclarecimento do mecanismo de trauma e suas possíveis lesões associadas.


A presença de traumatismo cranioencefálico, intoxicação alcoólica, lesões múltiplas, traumas da face e acima da clavícula aumentam a probabilidade da ocorrência de fratura da coluna vertebral.


O exame físico geral do paciente inicia-se pela avaliação de suas vias aéreas “com o controle da coluna cervical”, da sua respiração e ventilação, e da circulação (ABC), pois a prioridade, no atendimento inicial, deve ser para a avaliação, preservação e tratamento das funções vitais básicas.


Os pacientes com fratura da coluna vertebral sem lesão neurológica apresentam dor local, que pode irradiar-se para os membros, e incapacidade funcional, acompanhada de espasmo da musculatura adjacente.


Nos pacientes com lesão medular, podem ser observadas respiração diafragmática, perda da resposta ao estímulo doloroso, incapacidade de realizar movimentos voluntários nos membros, alterações do controle dos esfíncteres, priapismo e presença de reflexos patológicos (Babinski, Oppenheim), indicando lesão do neurônio motor superior.


Os pacientes com lesão medular podem apresentar, também, queda da pressão arterial, acompanhada de bradicardia, que caracteriza o denominado choque neurogênico. Nesses pacientes, a lesão das vias eferentes do sistema nervoso simpático medular e conseqüente vasodilatação dos vasos viscerais e das extremidades, associadas à perda do tônus simpático cardíaco, não permitem que o paciente consiga elevar a freqüência cardíaca. Essa situação deve ser reconhecida e diferenciada do choque hipovolêmico, no qual a pressão arterial está diminuída e acompanhada de taquicardia.


A reposição de líquidos deve ser evitada no choque neurogênico, para não sobrecarregar a volemia.


O exame neurológico consiste na avaliação da sensibilidade, da função motora e dos reflexos. A área de sensibilidade do paciente é examinada no sentido craniocaudal, desde a região cervical, pela avaliação da sensibilidade à variação de temperatura, sensibilidade dolorosa e sensibilidade tátil, que são funções mediadas pelo trato espinotalâmico lateral, cujas fibras estão na porção anterolateral da medula espinhal.


            A avaliação da vibração por meio de diapasão ou da posição espacial dos membros avalia as condições do trato posterior da medula espinhal (funículo grácil e cuneiforme).


            A avaliação da função motora tem como objetivo a determinação do grau de movimento que o paciente possui, avalia a função dos tratos corticoespinhais, sendo insuficiente a constatação apenas da presença ou ausência do movimento nas extremidades, que deve ser quantificado com relação ao grau de força muscular, que é determinada por meio de uma escala que varia de 0 a 5. A paralisia total é considerada 0; a presença de contração muscular palpável ou visível; a presença de movimento ativo, mas que não vence a força da gravidade, 2; movimento ativo que vence a força da gravidade, 3; movimento ativo que vence alguma resistência, 4 e movimento ativo normal. Deve ser lembrado que as raízes inervam mais de um músculo e que os músculos, geralmente, recebem fibras nervosas de mais de uma raiz  nervosa.


               Os reflexos tendinosos profundos são mediados pelas células do corno anterior da medula espinhal, e o trato posterior da medula espinhal (funículo grácil e cuneiforme).


               A distribuição dos dermátomos e algumas regiões anatômicas possuem relação com esses dermátomos e importância semiológica, como os mamilos (T4), processo xifóide (T7), umbigo (T10), região inguinal (T12-L1) e região perineal (S2- S3-S4).


               A avaliação da função motora tem como objetivo a determinação do grau de movimento que o paciente possui, avalia a função dos tratos corticoespinhais, sendo insuficiente a constatação apenas da presença ou ausência do movimento nas extremidades, que deve ser quantificado com relação ao grau de força muscular, que é determinada por meio de uma escala que varia de 0 a 5. A paralisia total é considerada 0; a presença de contração muscular palpável ou visível; a presença de


movimento ativo, mas que não vence a força da gravidade; movimento ativo que vence a força da gravidade; movimento ativo que vence alguma resistência, e movimento ativo normal, .


               Deve ser lembrado que as raízes inervam mais de um músculo e que os músculos, geralmente, recebem fibras nervosas de mais de uma raiz nervosa.


               Os reflexos tendinosos profundos são mediados pelas células do corno anterior da medula espinhal mesmo que a lesão medular não seja completa e permanente, e, nessa situação, o paciente apresenta ausência total da sensibilidade, dos seus movimentos e do reflexo bulbocarvenoso, que, normalmente, está presente. O retorno desse reflexo, que pode ser obtido por meio da estimulação do pênis ou clitóris, provocando contração do esfíncter anal, indica o término do choque medular, permitindo, então, a determinação do déficit neurológico após a lesão.


A avaliação clínica dos pacientes determina o nível de lesão neurológica, que é considerada como sendo o segmento mais caudal da medula espinhal que apresenta as funções sensitivas e motoras normais de ambos os lados. Quando o termo nível sensitivo é utilizado, refere-se ao nível mais caudal da medula espinhal, que apresenta sensibilidade normal, podendo, do mesmo modo, ser definido o nível motor. O nível esquelético da lesão é determinado por meio de radiografias e corresponde à vértebra lesionada.


A lesão medular é denominada completa, quando existe ausência de sensibilidade e função motora nos segmentos sacrais baixos da medula espinhal, e incompleta nas situações em que é observada preservação parcial das funções motoras abaixo do nível neurológico e inclui os segmentos sacrais baixos da medula espinhal.


Algumas síndromes medulares têm sido descritas e elas apresentam quadro neurológico característico, dependendo da localização da lesão no interior da medula espinhal.


A síndrome da medula central ocorre, principalmente, na região cervical e apresenta comprometimento mais acentuado dos membros superiores que dos membros inferiores.


Na síndrome da medula anterior, existe preservação da propriocepção e perda variável da função motora e da sensibilidade à dor. Na síndrome de Brown-Séquard, a hemisecção da medula ocasiona perda da função motora e proprioceptiva do lado da lesão e perda da sensibilidade à dor e temperatura do lado oposto. Na síndrome da medula posterior, a função motora, a sensibilidade à dor e tato estão preservados, enquanto que a propriocepção está alterada. A lesão da medula espinhal


no nível sacral, geralmente no nível ósseo de T12-L1 (síndrome do cone medular), resulta em incontinência fecal, vesical e alteração da função sexual. A sensibilidade está alterada nos 03 a 04 segmentos sacrais distais e segmentos coccígeos (anestesia em cela) e o reflexo bulbo cavernoso encontra-se ausente. A lesão isolada


dos nervos espinhais da cauda eqüina (lesão da cauda eqüina) no interior do canal vertebral, geralmente, ocorre nas fraturas distais a L1-L2, e, na verdade, não são lesões da medula espinhal. O quadro clínico depende da raiz atingida e podem ser observados paresia do membro inferior, arreflexia, distúrbios da sensibilidade e, também, incontinência fecal e vesical.


O termo tetraplegia refere-se à perda da função motora e ou sensitiva nos segmentos cervicais da medula espinhal devido à lesão dos elementos neuronais no interior do canal vertebral. A tetraplegia, resulta em alteração das funções dos membros superiores, tronco, membros inferiores e órgãos pélvicos, não sendo incluídas nessa categoria de lesão as lesões do plexo braquial e nervos periféricos fora do canal vertebral.


A paraplegia refere-se à perda da função motora e ou sensitiva nos segmentos torácicos, lombares e sacrais da medula espinhal, secundária à lesão dos elementos neurais no interior do canal vertebral.


Esse termo pode ser utilizado para definir as lesões da cauda eqüina e cone medular, mas não para as lesões do plexo lombossacro e lesões dos nervos periféricos, localizadas fora do canal vertebral.


e força motora normais.

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